Victoria, Natália e Tamires
Um
acontecimento recente, ocorrido dia 15 de fevereiro deste ano, tornou-se palco
de discussão acalorada nas redes sociais. A cantora Pop Adele levou seu filho
Angelo à um parque vestido de uma das princesas da Disney. Entre pessoas que a
apoiaram e outras que a criticaram, está a seguinte pergunta: qual o
significado da transição de uma criança entre os dois gêneros?
A
infância é um período de construções subjetivas. É por volta dos 3 ou 4 anos
que ela começa a ter percepções sobre o seu gênero e formam-se as primeiras
noções sobre si mesma. É assim que a criança entenderá sobre as diferenças
entre o seu corpo e o do outro, e também é quando serão assimiladas as relações
culturais, sociais e linguísticas. Durante essa fase, é comum que ela transite
entre os dois gêneros por curiosidade que pode ser percebida de diversas
formas: através do vestir-se, das relações ou das brincadeiras. Essa transição não faz da criança um
transgênero - indivíduo que não se identifica com seu sexo anatômico – nem um
homossexual – indivíduo que sente atração por outro ser do mesmo sexo que o seu.
O professor de psiquiatria da UFMG, Arthur Melo Kummer, questiona: “se você pudesse imaginar uma máquina em que as
pessoas pudessem entrar e sair como alguém do sexo oposto, quantas pessoas
entrariam por curiosidade?”.
Atitudes isoladas, como a vontade do menino de não
cortar o cabelo para que ele seja longo, ou a menina que quer andar sem camisa,
como o seu irmão, muitas vezes são vistas como diversão para a criança. Esse
flerte com as vestimentas, com as características ou brincadeiras intituladas
ao gênero oposto ao da criança, não necessariamente continuará até a
adolescência ou a fase adulta. Por outro lado, quando esse comportamento se
mostra muito frequente e insistente, ele merece atenção. Esse padrão
comportamental pode dar seus sinais desde a infância. Pesquisas feitas com
transgêneros adultos comprovaram que eles se lembram de vivências consideradas do
gênero oposto quando crianças.
A
idade média em que os indivíduos tomam consciência de sentirem-se sendo pertencente
ao sexo oposto ao qual nasceram é aproximadamente de oito anos, sendo que 80%
percebe isso antes de deixarem a escola primária. Sendo assim, muitas crianças
passam grande parte de sua infância sentindo que existe algo de diferente
nelas. De acordo com um estudo realizado
por Kennedy (2010) essas crianças podem sofrer extremo desconforto e muitas vêm
isso como “um erro de Deus”.
Esta
percepção é confirmada pelos relatos de adultos que se perceberam transgêneros
desde a infância. Eles mencionam que essas vivências eram acompanhadas de um
sentimento de estranheza, de que algo está errado, e de culpa. Estas percepções
acontecem porque com o passar dos anos a criança internaliza o que é
considerado culturalmente certo e errado. Por isso, para se defender, a criança
oculta seus sentimentos. Além disso, por ser um assunto considerado tabu na
sociedade, a pessoa transgênera cresce se sentindo a única do mundo que se percebe
assim, o que prejudica ainda mais a sua capacidade de autoafirmação e
autoconhecimento. Sendo assim, muitas vezes a criança ao longo do seu
desenvolvimento, cresce sob pressão da sociedade que a obriga a se comportar de
acordo com o gênero intitulado a ela. Todas essas variáveis podem afetar a vida
delas quando atingirem a maturidade.
Também
foi possível perceber através das entrevistas que a aparência possui uma
dimensão fundamental. Constata-se que para as mulheres transexuais, a aparência
tem grande importância na constituição da própria identidade, já que o
embelezamento é uma prática histórica associada à feminilização. Já para os
homens transexuais, questões relativas às relações de convívio com outros
homens são de grande relevância.
Por isso, é necessário que os pais e os educadores
estejam cientes do significado verdadeiro dessa transição na criança. São eles
que poderão ser a peça chave para que ela se desenvolva livre de preconceitos e
de maneira saudável, sentindo satisfação e realização por ela ser do jeito que
é. É necessário
que sejam consideradas às pressões que esse indivíduo sofre, tanto sociais
quanto culturais.
Referências
BARRETO, Ocilene
Fernandes; CECCARELLI, Paulo Roberto. Entre o Eu e o corpo... um estranho:
reflexões sobre as transexualidades. Revista
Reverso, Florianópolis, v.37, n.69, jun. 2015. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S0102-73952015000100012&script=arttext>. Acesso em:
15 março 2016.
JESUS, Jaqueline
Gomes de. Crianças Trans: memórias e desafios teóricos. Mai. 2013. Disponível
em: <http://www.uneb.br/enlacandosexualidades/files/2013/06/Crian%C3%A7as-trans
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Acesso em: 15 março 2016.
KENNEDY,
Natasha. Crianças transgênero: mais do que um desafio teórico. Revista Cronos, Rio Grande do Norte, v.
11, n.2, dez. 2010. Disponível em: <http://www.periodicos.ufrn.br/cronos/article.viewFile/2115/pdf>.. Acesso em:
15 março 2016.
MENDES,
Valéria. Transitar em outro gênero é curiosidade de criança, mas comportamento
insistente merece atenção. Jul. 2013. Disponível em: <http://sites.uai.com.br/app/noticia/saudeplena/noticias/2013/07/01/noticia_saudeplena,143864/visitar-o-outro-genero-e-curiosidade-de-crianca-mas-comportamento-ins.shtml>.
Acesso em: 15 março 2016.
SENKEVICS, Adriano. Ensaios de Gênero. Jan.
2012. Disponível em: < https://ensaiosdegenero.wordpress.com/2012/01/23/tomboy/>.
Acesso em: 15 março 2016.
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